sábado, 16 de março de 2013

CHORAR PARA QUE CHORAR ?




Ainda não me saiu da retina aquela cena exibida no telejornal local, já há algumas semanas.

Veio-me agora a vontade de escrever sobre depois que cumpri a obrigação acadêmica de resumir um texto de psicologia que falava da relação entre a delinquência e a privação emocional na infância e adolescência.

Mas não quero falar  aqui de psicologia, essa coisa enfadonha e sem certezas, dado, entre outras coisas, minha ignara sobre tal. É só uma parte curricular obrigatória e rasa. Portanto, voltemos à imagem.

Ela não falava do carnaval, nem de São João, de um balão no céu e nem luar do meu sertão, como dizia aquela versão em português da canção do Stevie Wonder.

Foi apenas um flagra dos jogadores do Náuas, chorando dentro do vestiário do estádio Arena da Floresta depois da goleada histórica sofrida diante do Rio Branco pelo placar de 7 x 1.

O grupo perdera naquela semana ( na verdade há dois dias do jogo) um colega de 17 anos, tragado pelas águas do rio Juruá-Mirim. 

Decerto não ter sido este o motivo da derrota de elástico placar. Ela estava escrita nas estrelas. Era um jogo de um time amador, formado exclusivamente por jovens rapazes da região, contra um time profissional e experimentado, de jogadores de várias partes do país.

Mas quem um dia já participou de um time de futebol, mesmo que seja amador, de bairro, sabe o quanto mexe com o emocional a perca repentina de um companheiro, se de morte for.    

Não sei qual foi a intenção da diretoria do time ou do canal de comunicação em divulgar aquelas imagens.

Espero que não tenha sido para causar compadecimento em quem realmente pode ajudar financeiramente o time. Digo assim porque creio ser inútil esperar que algum 'empresário' cruzeirense possa se sensibilizar com o esforço  daquela rapaziada.

Essa galera que detém juros superior a 200 % tem mais com o que se preocupar em uma localidade de fim de linha onde não existe a velha ( no à fora mundo capitalista) concorrência comercial. Eles não precisam divulgar suas 'marcas', ligá-las à prática saudável do esporte.

Talvez naquelas chamadas para as festas noturnas regadas a muito álcool seja mais interessante...ou quem sabe ajudando a eleição de certos políticos ou ainda melhor doar arroz com gorgulhos para instituições que já têm sobre seus cuidados quem antes poderia ter sido cuidado.

À eles (homens de negócio)  não há a obrigação legal e nem moral, tampouco a necessidade imediata e real.

Voltemos aos moços.  

Enquanto eles choravam copiosamente naquele vestiário, eu cá pensava: Mas por quê ?

O futebol não é a coisa mais importante na vida das pessoas. Seria talvez no máximo a mais importante entre o que menos importa ou o que menos importa do que mais possa importar para vida.

Aqueles meninos deviam estar, como uma boa parte dos jovens daquela idade e daquela faixa social aqui da região, fazendo coisas mais interessantes e menos compromissadas como por exemplo se embriagar nas festas de fim de semana ou fumar aquela mela nossa do dia a dia, fortalecendo o já numeroso exército de jovens transgressores e impunes de nossa sociedade. ( Por favor estou sendo irônico !! )

Ou então do outro lado da telinha, como canalhas rindo da cena se propiciada por outrem.

O campeonato acreano de futebol, o que é isso ? é uma competição falida, sem time de expressão, fadados, se não todos, a maioria, à extinção profissional. Incluam neste rol os times de Rondônia, Amazonas, Amapá, Roraima....

No capitalismo, como como qualquer outra coisa, o esporte é simples mercadoria. Nas regiões mais pobres, essa mercadoria não tem atraente invólucro.

Por que então chorar por coisa tão sem importância, capitalisticamente falando ?

Aí é que passa pela minha cabeça, em um exercício de empatia, que talvez aquilo seja tudo o que eles tinham ali naquele instante, era o tudo em quase nada. Deixaram aflorar os sentimentos ?

Alguém me disse que se sentiu envergonhado " no lugar deles, já que aquilo não era papel de homens". Um comentário estúpido, mas ao menos sincero de quem tem vergonha de ser gente. Não merecia nem uma observação da minha parte. Ainda assim, fiz umas perguntas retóricas:

_ Qual foi a última vez que você chorou, mesmo que em silêncio, na penumbra do quarto ? Pelo menos eles têm pelo o que chorar...eu confesso que  já perdi esta capacidade faz tempo. E se fosse o Neymar chorando depois de desclassificação do Brasil (cena quase impossível no mundo profissional de hoje) em uma Copa do Mundo, seria assim tão vergonhoso ? 

A atual diretoria do time enveredou pela opção de investir em um projeto de revelação de jogadores, garimpados nas camadas sociais mais carentes da região.

Talvez não consigam craques da bola. A possibilidade disto é muito pequena.

Mas se cumprir a maior missão de todas que é revelar cidadãos que assumam a responsabilidade, que tenham a capacidade de chorar por  ter fracassado nos objetivos mais próximos, por mais insignificantes que possam parecer para uma maioria orgulhosa de não ter motivos para lutar ou nada para dizer, a batalha e aquelas lágrimas não terão sido em vão.

Como estamos precisando de gente assim nesta cidade, Estado e país, que acima de tudo lutem por eles mesmos ou por aquilo que acreditam por mais singelo que seja !!!

Melhor ver aquele choro por algo tão medíocre ( capitalisticamente falando) que é o campeonato acreano de futebol, do que ver lágrimas de pais por coisa mais sérias como a destruição da vida de centenas jovens pelo falta de algo tão simples e pouco valorizado por aqui que é o bom vício de correr atrás de uma bola, quando não se está em sala de aula.

Pelo menos, não será por causa daqueles jovens que choravam naquele vestiário que os empresários de Cruzeiro do Sul terão que investir em mais sistema de segurança para proteger suas valiosas propriedades.

Decerto não serão por aqueles que o governo terá que aumentar gastos na segurança pública ou na saúde de recuperação das sequelas físicas e emocionais de uma parcela populacional, agora e principalmente amanhã.

Isto já basta para que eles tenham o meu respeito e apreço. O que acontece dentro das quatro linhas do gramado pouco me importa Como seria bom que ao menos por aqui o futebol(ou qualquer esporte de massa) não dependesse do resultado dos jogos, que se valorizasse o lado lúdico da coisa e seu apelo social. O que viesse seria lucro !

Que aqueles jovens continuem canalizando sua delinquência ( que no sentido da teoria psicológica é o movimento, poder destrutivo inato do homem) somente para o esporte e que não percam nunca a capacidade de chorar, mesmo que para alguns salte quixotesco...


Ps: 
Conquanto, isto tudo é boba filosofia. Melhor mesmo é ir para carreata comemorar o título dos times paulistas ou cariocas, exibindo a última camisa do patrocinador nike, adidas...a despeito de para eles Cruzeiro do Sul sequer constar no mapa. Mais é que a mesma televisão  a qual nos deixou obtusos, também nos deixou muito orgulhosos de fazemos parte de algo em que não temos parte alguma. Nisto não há motivos para choro...    
   

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