sábado, 28 de abril de 2012

ELA DA JANELA DA CASA DOS RUELAS




Localizada estrategicamente em um morrete na esquina da Luiz Meirim Pedreira com a Desembargador Távora fica a fantasmagórica 'casa dos Ruelas', uma das famílias (de origem lusitana) mais abastadas da sociedade cruzeirense em décadas de outrora. Estrategicamente, porque dela se avistaria o movimento de gente que chega e sai pelo rio Juruá.




A caminho de vários mercados de produtores e marreteiros, hoje, o movimento de pessoas ainda é grande naquela parte da cidade. Às pressas os transeuntes ignoram a paisagem já cansada. A velha casa a cada dia fica mais invisível. É como não existisse mais. É a monotonia da pressa moderna.

Abaixo  do que um dia foi uma pequena sacada protegida por barras de ferro e acima da porta principal frontal está gravada em relevo a data 1940, provavelmente ano de sua inauguração. Estranha mania da época que parecia adivinhar que ficaria a construção para a posterioridade a mostrar a exuberância de um passado não tão perfeito.

A velha construção pertence hoje a um comerciante forte desta plaga. Dizem que não vende e nem troca. Queria mesmo era derrubá-la. Reza a lenda que só não conseguiu seu intento  porque o prefeito à época declarou ser a casa 'patrimônio histórico', portanto, embargando a demolição.

Possivelmente em seu lugar ergueria mais uma dessas lojas ou mercadinho ultrapassados e apertadinhos que nem estacionamento ou qualquer outro conforto oferecem aos usuários. Coisa da mentalidade tacanha que ainda reina por aqui de achar que só existe movimento comercial se for " perto do rio". 

Conta-se que ainda foi oferecido outro terreno em troca. Por birra, o empresário não aceitou, como também não permitiu a reconstrução da casa. O empresário espera vencer o poder público pelo cansaço.

Se a conversa popular é verdadeira ou não, eu não sei. Só sei que como não sou nem um pouco normal, vez ou outra costumo passar horas a contemplar a construção fantasma e invisível aos outros. Isto porque uma força estranha que eu não poderia explicar me atrai o olhar e o pensamento quando por ali passo. 

Como num filme a mente viaja aos anos 40. Vejo a casa de paredes novas, toda pintada de branco com detalhes em vermelho, com ampla escadaria. Ouço vozes, choros e risos. Vejo reuniões de gente importante e bem trajada. Naquela casa, o poder econômico e político da pequena e isolada cidade era passado em conversas à boca pequena.

Se tivesse talento para escritor faria um romance a partir daquelas imagens. Mas sou só um blogueiro sem dom e de paupérrima qualidade.

Na pequena sacada surge o que parece ser um figura feminina. Eu ouço o que ela fala sem que ninguém a veja. Ela diz que o tempo gira e a roda da fortuna também. O que hoje é certo, amanhã não terá continuidade. O dinheiro e o poder sempre trocará de mãos.

Esta é a mensagem que a velha casa me diz. É  sua sina e assim quis o destino que permanecesse em pé até hoje, daquela forma ali esquecida, como esquecida foi a história  de seus antigos proprietários. Se ela tivesse sido reformada mesmo mantendo a arquitetura original jamais me despertaria tamanha curiosidade.

Sorte de muitos que há um pouco de loucos como eu a ver ou imaginar coisas  onde não existe e que na verdade não têm serventia alguma ao mundo real. A cidade não precisa mais dela. O que é do passado ficou por lá, preso ao tempo e espaço.

Mas aquela casa antiga e em ruínas me intriga, sobretudo porque ela não me diz só do passado mas também do presente e de um futuro próximo, de uma verdade insofismável : a mudança é a única certeza.

Quem sabe não seja eu que precise mudar primeiro...


7 comentários:

  1. Excelente texto... pena que boa parte da população não tenha essa sua visão. E assim nossa história vai ruindo... ao sopro do vento da ganância e pelas fortes gotas de chuva do capitalismo. Espírito cruzeirense não existe mais?

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  2. Jairo,
    estás cada vez mais afiado. É um texto belíssimo, me transportei junto contigo em tua narrativa. Quanto história deve encerrar em tal casa. Ecoou mais que história de teu texto, mas poesia.
    Para nós que temos essa caída pelas coisas de antanho, sem saudosismo e melancolismo, gosto de recordar os versos do Bilac: "Amai para entendê-las!/Pois só quem ama pode ter ouvido/Capaz de ouvir e de entender estrelas." e até mesmo casas, acrescento.
    Valeu!!! Abraços!!!

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  3. Abraão Cândido. O homem que ainda é "idolatrado" por muita gente aqui em CZS. Ele retirou propositalmente as telhas para ver se a Casa dos Ruelas cai mais rápido. Já fizemos reportagem sobre o patrimônio historico de CZs que voirou banheiro público, para o horror dos vizinhos. Agora eu pergunto: a municipalidade não pdoe solicitar a desapropriação antes q se acabe?

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  4. Olá, boa tarde... É a primeira vez q acesso esse blog, através do blog do meu primo Franciney. Moro em Manaus, poré sou Acreano de CZS e estudei no Colégio Instituto Sta. Terezinha e Col. Flodoardo Cabral de 84 a 86. Tenho acompanhado os jornais do Ac on-line e lamentavelmente vejo que ainda persiste uma espécie de feudalismo velado, ou até explicito, rs.. Como o que acabei de ver na minha saudosa Porto Walter, onde tantas vezes corri pelos campos qdo ainda era só um pequeno vilarejo perdido e miserável na imensidão do Juruá.
    A companheira do prefeito ainda tem a cara de pau, de afirmar que tais terras era da família do prefeito, é brincadeira, conheço esse povo á anos, e essa família nunca teve terras, exceto o terreno de suas próprias casas, e um roçadinho de tabaco q o prefeito cultivava qdo ainda era um estudante em PW, isso pelo início da década de 80.
    Quanto a desapropriação desse patrimônio histórico em questão, se o prefeito ou o IPHAN (Inst. do Patr. Hist. Artíst. Nac.)(nem sei se tem base desse órgão em CZS), tivesse moral, providenciava a desapropriação, mais o prefeito come na mão dos grandes empresários local, n é verdade?? Além de fazer estrada pavimentada p suas próprias terras, rs...
    Atenciosamente.
    Luíz Almeida

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  5. Ola me chamo Aubanita sou neta do senhor Maria Ruela proprietário desta casa preciso ir a cruzeiro para saber como esta a casa e as terras que meu avo deixou para minha mão senhora e Edite Ruela de Souza não sei a quem procurar qual quer informação em cotato068 99363326 agradeço

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  6. Assim como você, que se perde no tempo e no contemplo dessa casa em ruínas, eu, rio-branquense, que nunca tinha colocado os pés nas terras nauas (a não ser em outras vidas, assim suponho) me perdi em pensamentos, hipóteses e curiosidades ao me deparar pela primeira vez com a casa dos Ruelas, onde, contemplar tal testemunho dos tempos de outrora despertou em meu ser uma paixão avassaladora... Eu, uma arquiteta apaixonada pelo passado, pelos patrimônios e pela importância de preservar essa história, cultura, inicio uma pesquisa com o intuito de publicar artigos sobre a casa da família Ruela e uma luta pela preservação e tombamento definitivo de tal bem precioso. Feliz por ler seu texto. Obrigada!

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